O que o People Analytics não consegue captar

O que o People Analytics não consegue captar

Depois de dar uma palestra em uma consultoria global sobre como lidar melhor com as tensões de viagens longas e clientes exigentes, uma das consultoras me chamou de lado e confidenciou que não são apenas os clientes que os deixam loucos ― seu próprio chefe era um tirano intimidador que gritava com as pessoas caso houvesse a menor falha. Ele tornava a vida de seus subordinados diretos tão infeliz que muitos dos melhores se mudavam para outras empresas.

Esse encontro me veio à mente quando li a recente reportagem de capa da TIME sobre a última moda em recursos humanos, o uso de análises de big data e testes de personalidade para prever quem é melhor para um determinado trabalho ― o chamado “QX”.

É claro que muitas empresas estão colhendo bons frutos da análise de big data. Mas também há algumas áreas de frustração. Os especialistas alertam que big data, como outros dados, são tão bons quanto as perguntas feitas ― e que alguns algoritmos podem fazer suposições inúteis.

Há um ditado em Ciências: “A Estatística significa nunca ter de dizer que você tem certeza.” Em uma análise maciça de dados, por exemplo, haverá correlações aleatórias que parecem “significativas”, mas que na verdade são apenas ruído, não um sinal.

E então há a questão de que métricas um teste de personalidade usa para medir o “sucesso”. Big data precisa de uma métrica de resultado difícil para o desempenho, mas as métricas disponíveis mais prontamente podem não ser, na verdade, as variáveis ​​mais importantes para o êxito da organização.

Um gerente ― como o tirano mesquinho e desmotivador mencionado acima ― pode, por exemplo, obrigar seu pessoal a trabalhar arduamente para atingir metas trimestrais enquanto destrói o clima emocional que sustenta a força motriz de uma organização. Há muito tempo, sabemos que os gerentes que se concentram demais no desempenho em detrimento das pessoas podem ser desastrosos para a organização a longo prazo. Usar como métrica de resultado o desempenho dos bônus de um executivo e, ao mesmo tempo, ignorar seu papel como chefe e seu impacto no moral, lealdade, foco e níveis de estresse de seus subordinados diretos, pode resultar em uma falsa indicação de quem realmente é o melhor chefe.

É revelador que, na Google ― esse baluarte de algoritmos que emerge de gigantescos conjuntos de dados ― os engenheiros se recusaram a usar apenas esse método para decidir sobre promoções. Como explicou Laszlo Bock, responsável pelas contratações da Google, o fato de a empresa saber muito sobre algoritmos permite que ela enxergue seus limites. As suposições incorporadas a um teste podem ter um viés contra certas características e, assim, fazer discriminações injustas.

Mas a maior objeção vem do fato de o indicador mais forte do comportamento futuro de uma pessoa ser seu próprio histórico de desempenho, que é mais bem avaliado por pessoas que conhecem bem esse candidato.

Esse é o caso, por exemplo, de Claudio Fernandes-Araoz em seu clássico sobre contratações, It’s Not the How or the What but the Who: Succeed by Surrounding Yourself with the Best. Ele aconselha que as informações mais confiáveis e valiosas sejam obtidas de entrevistas honestas com pessoas que trabalharam no passado com determinado candidato.

Considere o poder do caráter de um líder ― um fator que as entrevistas, não os testes de múltipla escolha, podem avaliar melhor (afinal, alguém que não tem integridade provavelmente mentirá sobre os indicadores de honestidade). Como mostra a pesquisa de Fred Kiel, traços de caráter como integridade e compaixão são condutores surpreendentemente fortes de sucesso nos negócios. Aqueles que possuem essas qualidades, descobriu Kiel, obtiveram resultados de negócios cinco vezes melhores do que os que eram deficientes nesses pontos.

Ao avaliar a integridade de um candidato, você confiaria: em como essa pessoa respondeu a perguntas de um teste com base na honestidade ou na experiência realmente vivenciada pelas pessoas que conhecem esse candidato?

Então, aqui está o que eu recomendaria. Tenha em mente a distinção entre uma competência que limita e uma que distingue. Uma competência que limita significa que todos devem atender a esse critério apenas a fim de serem considerados para um trabalho. Na Google, essa competência inclui pontuações de testes que mostram que você está no top 1% de QI. As empresas que usam o chamado QX, utilizam a análise de big data dos resultados dos testes e podem considerar um certo nível de correlação como limite.

Depois disso, no entanto, estão as competências que distinguem, as habilidades que você encontra em profissionais de primeira linha em uma organização, mas não naqueles que são medíocres ― aqueles que são bons apenas para manter o emprego. São as competências distintivas que você procura em sua investigação com pessoas que já trabalharam com esse candidato no passado.

Por Daniel Goleman