As cientistas Donna Strickland e Frances Arnold ganharam destaque na semana passada. Não apenas por receberem o Nobel de Física e o Nobel de Química, respectivamente, mas pelo fato de mulheres estarem entre as laureadas deste ano. Donna foi apenas a terceira mulher a receber o prêmio e Frances, a quinta mulher cientista a ser laureada na área.
Uma mulher receber um Nobel é alto raro. Desde 1901, 854 premiados foram homens e 50 foram mulheres. Isso levanta questões sobre a inserção feminina em carreiras relacionadas às ciências. Elas ainda são minoria nas áreas STEM (sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática).
Diversos estudos mostram que as mulheres que se dedicam a essas carreiras enfrentam barreiras implícitas e explícitas – o preconceito é intenso nesses campos, dominados por homens. Mas o que as impede de avançar nessas áreas? Uma matéria do The Conversation, em parceria com o Fórum Econômico Mundial, tenta explicar.
Boas notícias para o início de carreira
Apesar do estereótipo tradicional de que “as mulheres não gostam de matemática” e “não são boas em ciências”, várias pesquisas contrariam essa visão. Estudos mostram que meninas e mulheres evitam cursos superiores na área STEM não pela inabilidade cognitiva, mas por causa de políticas educacionais que não as incentivam nessas áreas, estereótipos e falta de exemplos de outras mulheres bem-sucedidas.
Nas últimas décadas, os esforços para aumentar a representatividade de mulheres nesses campos focaram em contrariar esse estereótipo com reformas educacionais e programas individuais para aumentar o número de meninas que entram nessa área.
Esses esforços estão dando resultado, mas a mudança é lenta. De acordo com o Instituto de Física dos Estados Unidos, as mulheres representaram 20% das formadas em física nos últimos anos, ante 10% em 1975. Em computação e matemática, contudo, a participação feminina caiu desde o início da década de 1990.
O que não está funcionando
As mulheres enfrentam barreiras estruturais e institucionais em carreiras STEM. Além dos problemas históricos com a desigualdade de pagamento, a estrutura das universidades muitas vezes dificulta que as mulheres avancem na carreira acadêmica. Fazer pesquisa científica frequentemente demanda anos de dedicação no laboratório, o que pode dificultar o equilíbrio entre trabalho e vida social e familiar.
Trabalhar em locais dominados por homens é outro fator que afasta as mulheres do campo STEM. As cientistas mulheres relatam se sentir isoladas, suscetíveis a assédio e excluídas de oportunidade de networking. Quando há menos de 15% de mulheres no ambiente de trabalho, elas se sentem menos capacitadas a se defender e se sentem como uma minoria, ou uma exceção. Se sentindo uma minoria, são mais propensas a aceitar trabalho a mais.
Universidades, fundações e entidades governamentais têm trabalhado para resolver essas barreiras estruturais. Os esforços incluem a criação de políticas que facilitem o equilíbrio entre trabalho e cuidados com a família, transparência de salários, mentorias e programas especiais para mulheres cientistas e o incentivo à contratação de mulheres.
Viés implícito
Todo mundo – o público, a imprensa, os funcionários de universidades, estudantes e professores – tem uma ideia de como se parece um ganhador de prêmio Nobel. A imagem que vem à cabeça é predominantemente de um homem, branco e de meia idade. Isso não acontece por acaso: 97% dos laureados são homens.
É um exemplo de viés implícito: uma presunção inconsciente, involuntária, natural e inevitável. E as pessoas tomam decisões com base nessa ideia inconsciente, e às vezes mesmo que essa decisão vá contra crenças conscientes.
Pesquisas mostram que esse viés implícito contra as mulheres como especialistas e cientistas acadêmicos é generalizado. Ele se manifesta em bolsas de estudo mais elevadas para homens, e na concessão de mais bolsas a homens do que a mulheres. O preconceito implícito pode prejudicar a contratação, o avanço e o reconhecimento do trabalho das mulheres. Homens citam trabalhos próprios 56% mais do que mulheres. Pesquisas assinadas por mulheres têm menos chances de ser citadas por outros. Trabalhos assinados por uma mulher demoram o dobro do tempo nos processos de revisão antes de serem publicados.
E mesmo quando uma mulher se torna uma cientista reconhecida internacionalmente, ela é convidada para conceder menos palestras para compartilhar sua pesquisa, o que resulta em menor visibilidade e menor chance de receber um prêmio.