Por uma República mais digital

República mais digital

Nem a Lava Jato, nem a alta temperatura nas redes sociais ou a politização crescente de várias esferas da vida ampliaram a participação nas eleições municipais de 2016. Ao contrário. O total de abstenções, votos nulos e brancos chegou a 32,5% do eleitorado naquele ano contra 26,5% em 2012, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em números absolutos, mais de dez milhões de pessoas aptas a votar não fizeram sua escolha. Em São Paulo, uma aberração: o prefeito eleito teve menos votos do que a soma de abstenções, nulos e brancos.

Vamos às urnas a cada dois anos, só que não. Fica nítido o descompasso entre nosso desejo de mudança e a atitude concreta de colocá-lo em prática. Falta de opções interessantes? Falta de esperança? Falta de confiança? Acrescentaria à lista uma hipótese: falta de um sistema de participação política digital. Em um cenário de soluções tão ágeis e fáceis pelo celular, por que não digitalizar (de verdade) os meios de expressão da vontade popular?

Houvesse canais oficiais na internet, poderíamos não apenas votar à distância nos pleitos municipais, estaduais e federais, mas realizar plebiscito sobre grandes temas ou mesmo engajar as pessoas em processos decisórios relevantes como reformas econômicas e sociais. Tudo isso com várias possíveis vantagens:

1) Não seria necessário aguardar tanto tempo para manifestar nossa opinião;

2) Mais gente se sentiria estimulada a participar, já que o brasileiro é fã de novas tecnologias;

3) Blockchain e outros recursos garantiriam a autenticidade e segurança às participações;

4) Teríamos redução de despesas com estruturas físicas como repartições, quadro de funcionários etc.

Na esfera pública, a agenda digital tem se concentrado em realizar melhorias na eficiência do estado. Não sem motivos. Os serviços públicos ganhariam muito em produtividade e transparência. Menos filas, menos desperdícios, menos corrupção, menos desrespeito ao cidadão, enfim. Índia, Estônia e Uruguai já deram os primeiros passos nesse sentido, mostrando que não importa o tamanho do país nem seu grau de desenvolvimento para inovar.

Por meio de uma plataforma desenvolvida pelo governo, os indianos podem ter uma identidade digital e acessar serviços públicos pela internet, a qualquer hora e lugar. Os uruguaios trabalham para que a população inteira conte com uma identificação digital até 2020. Os estonianos, referência no assunto, já exportam para outros países seu modelo de adotar uma identidade digital única e vitalícia, que abre as portas para todos os deveres e direitos de um contribuinte.

A cidadania pensada como user experience é um avanço, mas precisamos ir além da desburocratização. É necessário incluir no horizonte a modernização do exercício das práticas democráticas, aumentando as oportunidades e meios legítimos de manifestação popular. As escolhas políticas que fazemos (ou não) e nosso envolvimento (ou não) com os rumos do país são a base para a construção de um estado eficiente e orientado pelo ponto de vista do cidadão.