Quando a sonda Mars InSight pousou em Marte, por volta das 18h (horário de Brasília), o brasileiro Ramon de Paula era uma das pessoas no centro de controle da missão em Pasadena, na Califórnia. O engenheiro paulista chefia as missões da Nasa para o planeta vermelho desde 2000 e já trabalhou no desenvolvimento das operações Odyssey (2001), Mars Reconnaissance Orbiter (2005), Phoenix (2007) e Curiosity (2011).
A InSight encerrou hoje sua viagem de sete meses e se tornou a primeira sonda a aterrissar em solo marciano em seis anos. Ela chegou à atmosfera de Marte a uma velocidade de 19,7 mil quilômetros por hora.
A entrada gerou temperaturas superiores a 1,5 mil graus Celsius, e foi preciso que o veículo se aproximasse do planeta a um ângulo de 12 graus. Todos os ajustes precisaram ser feitos pela equipe na Terra algumas horas antes da aterrissagem. Depois disso, a sonda trabalhou sozinha na descida.
Cerca de um terço dos equipamentos enviados pela Nasa a Marte nunca conseguiram passar por essa etapa. A sonda InSight é a primeira com capacidade para explorar o interior do planeta. Seus instrumentos irão coletar dados como temperatura, ondas sísmicas e a dissipação do calor que vem do interior do planeta.
Nesta segunda-feira (26/11), o trabalho de De Paula, que está na agência espacial desde 1985, é supervisionar o que está acontecendo e se comunicar com a sede da Nasa, em Washington. Em conversa com Época NEGÓCIOS, ele explica a importância dessa missão.
Por que Marte é o planeta mais explorado pela ciência? Qual a importância das missões ao planeta?
Marte é um dos planetas mais acessíveis, é o mais parecido com a Terra e foi formado na mesma época. Eu diria que Marte tem o mesmo DNA da Terra. É um “planeta terrestre”, o que chamamos de planeta irmão. Mas o que aconteceu com o tempo? Onde foi parar toda a água que tinha em Marte? O que aconteceu com a atmosfera? Queremos entender o que ocorreu com Marte para saber se esse processo um dia poderia acontecer com a Terra. E quem sabe também usar esse conhecimento para proteger a Terra, que é um planeta lindo, especial.
O lançamento da InSight estava originalmente previsto para 2016, mas precisou ser adiado. O que acontece quando as missões dão errado?
No caso da missão InSight, tivemos um problema com um dos instrumentos mais importantes da missão, que precisa ficar em uma câmara de vácuo. O problema é que essa câmara estava vazando e não conseguíamos manter o vácuo. Portanto, tivemos de adiar a missão por dois anos para resolver essa questão. Faz parte do desenvolvimento da engenharia e da ciência. Às vezes, você quer fazer certas coisas em tempo menor, mas precisa de mais tempo para alcançar a maturidade daquela tecnologia, daquele conhecimento. A mesma coisa aconteceu com o rover Curiosity. Hoje, está funcionando excelentemente, mas em 2009 tivemos de adiar a missão em dois anos porque os motores do rover estavam com problemas.
Hoje, há muitas empresas privadas interessadas na exploração espacial. Como esse setor se desenvolveu ao longo da sua carreira?
A Nasa sempre trabalhou com a indústria e tentou tirar o melhor dela em termos de conhecimentos e habilidades especiais. Um exemplo disso são os satélites de comunicação. Usamos o conhecimento das empresas para desenvolver muitos dos nossos orbitadores de Marte. Porém, nas missões mais específicas, ou no caso dos rovers, o desenvolvimento é feito nos nossos laboratórios e no nosso centro de desenvolvimento. Mas ainda assim compramos ou pedimos para a indústria criar alguns dos equipamentos usados, como motores e computadores. Se você olhar para trabalho da Nasa nas décadas de 50, 60 e 70, quando começamos o desenvolvimento de foguetes e o programa Apollo, tudo era realizado nos centros de desenvolvimento da Nasa. Com o tempo, algumas coisas passaram a ser feitas pela indústria — a Nasa depende cada vez mais dela para os lançamentos dos foguetes, por exemplo. Acho que veremos mais coisas sendo desenvolvidas pelas empresas, e as agências governamentais terão o foco em missões específicas e complexas.