Desde 2015, a União Europeia observa a ascensão educacional de um país que, a despeito de ainda sentir os efeitos de uma grave crise econômica e estar entre os mais pobres do bloco, chama atenção por seus resultados no principal teste internacional de educação.
Portugal conseguiu que seus alunos de 15 anos ficassem acima da média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, organização também conhecida como “clube dos ricos”) nos domínios avaliados pelo Pisa: ciências, leitura e matemática.
Aliás, desde que o exame começou a ser aplicado pela OCDE nos anos 2000, a cada três anos, Portugal avança um “bocadinho”.
Assim, há pelo menos uma década e meia, o país europeu mantém essa trajetória nos seus resultados e é o único do continente que melhora seu desempenho a cada ano.
Nem mesmo nos períodos mais duros da última grande crise, com a redução de investimentos e o ajuste fiscal imposto pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia, essa evolução cessou.
É tamanha a consistência de resultados que Portugal hoje recebe informalmente a alcunha de “estrela ascendente da educação internacional” – e fez isso sem apostar em nenhuma grande estratégia educativa, mas investindo nas pessoas que formam a comunidade escolar, especialmente as mães e as crianças de 0 a 6 anos.
Apesar dos resultados positivos, a interpretação é de que ainda há muito a melhorar. A recomendação do professor António Gomes Ferreira, diretor da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, é ter prudência na leitura dos dados.
“O Pisa traduz uma boa evolução, mas não uma boa colocação: Portugal está apenas ligeiramente acima da média da OCDE, ocupando um lugar simplesmente mediano”, afirma.
Entre os 72 participantes no teste, a pontuação de Portugal na última avaliação foi oito pontos superiores à média em ciências, cinco pontos em leitura e dois pontos em matemática – esta última diferença não é considerada estatisticamente significativa.
A colocação final dos alunos portugueses foi 17º lugar em ciências, 18º em leitura e 22º em matemática – o que posiciona o país entre os melhores do mundo, mas distante ainda do desempenho dos sistemas educacionais de referência globais, como Cingapura, Finlândia, Hong Kong, Canadá e Suíça.
“O que o Pisa e outras avaliações nos mostram é que Portugal está num patamar de país desenvolvido, mas ainda longe de acompanhar os que estão no topo”, diz Gomes Ferreira, que coordena o Grupo de Políticas Educativas e Dinâmicas Educacionais do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século 20 (CEIS20).
No entanto, ele concorda que não é por acaso que o país demonstra avanços no estudo – e que isso merece ser reconhecido.
Escolarização das mães e atenção à primeira infância
Nos últimos 50 anos, Portugal tem apresentado uma evolução educacional que vai além da dimensão escolar. Advém de um esforço amplo de mudança do status socioeconômico e cultural da população em geral, particularmente das comunidades de menor renda.
A partir dos anos 1970, Portugal universalizou o ensino, passando a ter todas as crianças em idade escolar na escola. Isso significa que os pais das crianças que estão hoje na escola são a primeira geração escolarizada – isso leva a outra maneira de educar e também a expectativas diferentes em relação ao percurso acadêmico dos filhos.
Em um período mais recente, entre 2003 e 2015, o número de mães que completaram ao menos o ensino secundário, equivalente ao ensino médio brasileiro, subiu 41%.
“O indicador que mais influencia o rendimento escolar é a educação e a escolarização da mãe”, diz Ferreira.
“Se temos hoje mães mais educadas e mais encorajadas, é natural que tenhamos crianças mais capazes de se inserir na escola, de se envolver e de evoluir na escola.”
Outro aspecto positivo está na primeira infância. A mortalidade infantil até aos 5 anos de idade em Portugal caiu 94% desde os anos 1970, segundo a Unicef, passando de 68 mortes de crianças em cada mil nascimentos para 4 em cada mil em 2015.
Um relatório de 2017 indica ainda que só 15 países, entre eles Portugal, adotam as três políticas nacionais básicas de apoio a pais de bebês e crianças pequenas no período mais crítico de seu desenvolvimento, com dois anos de educação pré-primária gratuita, pausa para amamentação no trabalho para as novas mães nos primeiros seis meses e licença parental adequada.