O envelhecimento da população brasileira que ameaça a sustentabilidade do atual sistema previdenciário está fazendo cada vez mais gente repensar estratégias para se preparar para o futuro. Segundo estimativa do economista Rogério Nagamine, pesquisador do Ipea, hoje, o país já tem dois contribuintes para cada beneficiário do sistema de aposentadorias e pensões. Em 2040, se nenhuma reforma for feita, essa proporção chegará a um para um.
Em 2050, o Brasil terá mais beneficiários que contribuintes. Esse quadro tende a intensificar um movimento observado nos últimos anos: a busca por planos de previdência complementar. Em cinco anos, as reservas nesse tipo de investimento mais que dobraram, de acordo com dados da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi).
A dificuldade de manter a Previdência Social equilibrada tem a ver com a forma como funciona o sistema no Brasil e com a mudança do perfil demográfico. O modelo brasileiro é o regime de repartição: na prática, quem está na ativa contribui para quem está aposentado. O problema é que o país está envelhecendo. Segundo dados do IBGE, a proporção de idosos com mais de 65 anos em relação a quem tem entre 15 e 64 cresce rapidamente. Será de 14,18% no início da próxima década e dobrará em menos de 30 anos.
— O envelhecimento vai gerar uma piora muito grande na relação entre contribuintes e beneficiários. Claramente, há todos os indícios de que estamos em uma trajetória insustentável do ponto de vista de regime de Previdência pública. Será necessário algum tipo de ajuste em termos de idade, mas é possível que também haja reflexos no valor do benefício — analisa Nagamine.
Conquista recente
Na avaliação de especialistas, o quadro ajuda a explicar a corrida para algum tipo de poupança complementar. Segundo dados da FenaPrevi, as reservas em previdência privada saíram de R$ 319 bilhões, em 2012, para R$ 756,1 bilhões, em 2017, uma alta de 137%. No mesmo período, o número de participantes em planos cresceu quase 30%, para pouco mais de 13 milhões, quase 15% da população ocupada.
Para Edson Franco, presidente da FenaPrevi, o cenário aponta uma consolidação do hábito de poupar do brasileiro, que só foi possível após a estabilização da moeda e o controle da inflação, há cerca de 20 anos.
— A geração da hiperinflação teve de formar, aos poucos, uma cultura de poupar a longo prazo. É uma conquista relativamente recente. Não atribuo essa evolução à discussão da reforma da Previdência. À medida que as pessoas tomem consciência do sistema de Previdência pública, e diante do fato de que o Estado não será capaz de continuar provendo o mesmo nível de benefícios, é natural que haja uma maior busca por instrumentos de poupança de longo prazo — afirma.
Jorge Pohlmann Nasser, diretor-presidente da Bradesco Vida e Previdência, traça um paralelo com o modelo adotado nos Estados Unidos:
— A médio e longo prazos, é certo que o mercado tem espaço para crescer de forma importante. O Brasil tem reservas previdenciárias que representam 12% do seu PIB. Nos EUA, são quase 80%, de um PIB muito maior. Isso, sem dúvida, tem a ver com o modelo previdenciário, com a cultura previdenciária. O americano nasce pensando em aposentadoria.
O professor universitário Gustavo Mello, de 53 anos, é um dos que começou a se preocupar mais com a poupança, não apenas por uma mudança nos hábitos, mas nas expectativas. Sua maior preocupação é não ter direito a receber o salário integral, como é previsto pelas regras atuais. A reforma apresentada no ano passado pelo governo Michel Temer previa a manutenção do benefício integral para servidores públicos antigos, mas Mello teme revisões mais duras. Por isso, começou a poupar:
— Quando tiver 65, eu me vejo em uma situação em que a Previdência terá sido reformada e terei, no máximo, acesso ao teto (do INSS, de R$ 5.645,80). Não acredito que, daqui a 12 anos, vou ter o salário da ativa. Por isso, comecei a poupar, para ter uma renda complementar no futuro.
Mello dispensou o fundo de previdência privada tradicional: resolveu formar ele mesmo sua poupança. Todo mês, busca reservar cerca de 10% de sua renda para investimentos. A maior parte deposita na caderneta de poupança. Uma parcela menor vai para uma carteira de ações que ele criou, com base em pesquisas e conversas com amigos.
— Em períodos de bonança, as ações pagam 30%. Montei minha carteira, ação por ação, conversei com um monte de gente, levei alguns meses estudando, gastando algumas horas por semana. O objetivo é de longo prazo, ter algo daqui a dez anos — explica Mello.
Na agenda eleitoral
Em ano eleitoral e diante do déficit bilionário do sistema, a Previdência ganhou força nas propostas dos presidenciáveis. Pelo menos quatro dos principais postulantes planejam uma reforma estrutural, que prevê a transição, total ou parcial, para o chamado regime de capitalização — semelhante à previdência privada, mas gerido pelo Estado.
Nesse modelo, cada contribuinte faz aportes para sua própria conta, em vez de pagar na ativa pelos benefícios dos idosos. A maior crítica à implantação desse sistema é o elevado custo de transição entre os dois modelos. Além disso, há o risco de que imprevistos ao longo da trajetória de trabalho de cada um façam com que o benefício fique abaixo do esperado — fenômeno que ocorreu no Chile, país usado como referência desse sistema.