O futuro do mercado de trabalho gera tensão para a maioria dos profissionais. O risco de os robôs eliminarem muitos empregos disponíveis atualmente faz com que as pessoas corram atrás de cursos de reciclagem, novidades sobre empresas de tecnologia e reflitam sobre a própria formação. O engenheiro Paulo Feldmann, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, afirma que a tendência de as máquinas substituírem os profissionais — descrita por ele há 30 anos no livro Robô: Ruim com ele, pior sem ele (Editora Trajetória) — ganhou fôlego e, agora, tornou-se iminente.
“Os robôs agora podem desenvolver atividades que antes eram específicas dos seres humanos”, diz Feldmann, que crê que as máquinas poderão substituir até pessoas de alta qualificação, como médicos e engenheiros. Com isso, o professor acredita que, no futuro, os profissionais terão de se formar em conhecimentos gerais, e não mais em áreas específicas — estratégia que já está sendo colocada em prática no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets), nos EUA.
Conversou com Paulo Feldmann. Abaixo, os principais trechos:
Existe risco de os robôs realmente substituírem o trabalho humano?
Nos últimos 30 anos, as coisas mudaram muito. Antes, os empregos eliminados por robôs eram substituídos por vagas criadas em novas atividades. Naquela época, as funções dos robôs eram exclusivamente mecânicas e impactavam a indústria. Desta forma, restavam oportunidades no setor de serviços.
Com a inteligência artificial, no entanto, o problema se tornou muito maior porque os robôs podem desenvolver atividades que antes eram específicas dos seres humanos. Desta forma, as máquinas agora estão, de fato, substituindo até pessoas de alta qualificação, como médicos e engenheiros. O setor de serviços também foi automatizado, justificando o temor do desemprego em todo o mundo.
Há alguma atividade que resistirá por mais tempo?
Atividades manuais que exigem detalhismo são mais difíceis de serem eliminadas, como odontologia. O corretor de imóveis provavelmente será extinto, assim como o contador, uma vez que os algoritmos podem executar o trabalho deles. Estudos mostram que a probabilidade dessas carreiras serem excluídas pela tecnologia é de 99%.
É possível se atualizar para acompanhar essa evolução tecnológica?
Acho difícil. As pessoas vão ter de se acostumar com a mudança de profissão. Há casos em que a carreira é totalmente eliminada. As empresas de pagers, por exemplo, tiveram de demitir milhares de funcionários. O mesmo ocorreu com datilógrafos e telefonistas. É difícil aproveitar o conhecimento que a pessoa já tem para fazer outras coisas.
As universidades têm de parar de especializar as pessoas. Os profissionais têm de ser preparados para assumir qualquer profissão, uma vez que o mercado muda com tanta rapidez que não há tempo de se readequar às novas exigências. Acredito que o profissional do futuro terá de se formar em conhecimentos gerais, uma vez que as profissões surgem e deixam de existir rapidamente.
No MIT, por exemplo, estão juntando os cursos de engenharia com o de medicina porque, no futuro, os médicos terão de saber usar e até projetar equipamentos. A tendência é de uma maior convergência de profissões.
Essa formação em conhecimentos gerais inviabilizaria uma pós-graduação?
A pós-graduação faz mais sentido porque é posterior à graduação. Mas, ainda assim, as instituições de ensino terão de reformular os cursos porque o conhecimento específico estará disponível na internet, de forma que os alunos poderão estudar sozinhos.
Se os profissionais deixarem de ser especialistas, como ficarão os salários?
Esta é uma grande incógnita. A previsão de desemprego é enorme, e a sociedade terá de se modificar totalmente para conviver com essa realidade. Provavelmente, devem estabelecer uma renda mínima para a população que não trabalha.
O governo terá de prover dinheiro à população até que as pessoas tenham emprego. Esse seria basicamente o auge e o fim do capitalismo, quando tudo será tão mecanizado para redução de custos, que não haverá mais trabalho. A previsão é que isso aconteça entre 2045 e 2050.
Novas profissões em tecnologia não podem amenizar esse cenário?
Estudo feito no Canadá mostra que apenas 4% das profissões atuais foram criadas recentemente. A tendência de novas carreiras deve se manter nessa média, o que é um percentual baixo frente à quantidade de postos que devem ser eliminados. Não tem como ser otimista.
Há algo que possa, ao menos, reduzir a velocidade da robotização?
A França e a Itália reduziram a jornada de trabalho para gerar mais emprego. A estratégia, contudo, não deu certo porque muitas empresas mudaram de país e foram para a China. A tática só daria certo se todos os países fizessem o mesmo, mas desde que um país não cumpra, os demais ficam desestabilizados.
Uma reflexão mais que necessária