Entender as razões pelas quais algumas pessoas têm câncer e outras não é o maior desafio da pesquisa oncológica hoje, afirma um dos maiores especialistas na área, o pesquisador da Universidade Columbia Siddhartha Mukherjee.
A razão, diz o médico, é que há uma boa compreensão sobre as causas da doença, mas pouco se sabe o que, de fato, protege uma parte da população. “Quando começarmos a responder o porquê, será um momento realmente transformador.”
Autor do livro “O Imperador de todos os Males”, pelo qual recebeu o prêmio Pulitzer em 2011, Mukherjee fez na abertura do seminário Tecnologia Contra o Câncer, realizado pela Folha, com patrocínio da Roche e apoio do Hospital Sírio-Libanês e da farmacêutica Abbvie.
O aumento no número de casos da doença se deve à maior expectativa de vida, afirma o indiano radicado nos Estados Unidos. “O câncer é, ironicamente, um sintoma do nosso sucesso como seres humanos”.
Entre os desafios para o tratamento da doença, Mukherjee destacou a variedade do que chama de “impressão digital genética” de cada câncer. “Podemos olhar para duas mulheres com câncer de mama, dois tumores aparentemente iguais, com as mesmas características, e eles podem ser duas doenças completamente diferentes.”
O papel da medicina personalizada é entender, entre as características genéticas iguais e distintas de cada câncer, quais são as mais importantes e devem ser atacadas pela medicação.
Apesar de discutir profundamente o tratamento, o pesquisador defende que se concentre esforços para prevenir a doença. Na divisão de recursos, a maior parte deve ser gasta na prevenção, uma parte intermediária com o tratamento precoce e a menor com o tratamento da doença desenvolvida.
Entre os fatores de risco, Mukherjee destacou o tabagismo e a obesidade. Iniciativas que reduziram o número de fumantes nos EUA, por exemplo, são ligadas à queda nos casos de câncer de pulmão e laringe.
“Precisamos pensar o que pode ser modificado. O comportamento humano é complexo. Se você falar para uma pessoa que o cigarro aumenta 200% a chance de ter câncer, ela vai te agradecer, sair do consultório e acender um cigarro.”
Os efeitos da alimentação também precisam ser melhor compreendidos, afirmou Mukherjee, contando que, após passar por uma cirurgia, perguntou ao seu médico o que deveria comer.
“Ele respondeu ‘não sei’. “As duas coisas são moléculas: uma se chama morfina e a outra, carboidrato. Por que confiamos tanto em um grupo e não temos nada a dizer sobre o outro?”
E o que dizer aos que sobrevivem à doença? Que fiquem atentos à possibilidade de reincidência, mas não se privem de uma vida normal, declara o pesquisador.
“As pessoas curadas tendem a sofrer restrições de comportamento, o que, na maior parte das vezes, não faz sentido. Parte do luxo de se curar de um câncer é poder voltar a uma vida normal.”
Ele também destacou o erro comum de atribuir a doença a um único comportamento, enquanto os especialistas acreditam em uma combinação complexa de causas.
“Não culpem os sobreviventes. Não digam a uma pessoa que venceu o câncer que a doença foi culpa dela. Nós não podemos afirmar que foi.”