quando pensamos na indústria da moda e nos impactos causados por ela, raramente paramos para entender nossa responsabilidade nisso tudo. E ela não é pequena.
Não pretendo aqui, de forma alguma, responsabilizar o consumidor, já que, para quem está fora desse mercado, ter uma noção sobre a complexa e longa cadeia de produção não é tarefa fácil.
Apesar dos impactos sociais e ambientais negativos trazidos por essa indústria não serem recentes, apenas com a globalização e a facilidade de acesso às informações passamos a compreender mais profundamente os problemas desse setor. E esse conhecimento nos oferece a chance de ir em busca de uma mudança.
A moda nos proporciona criatividade, além de ser peça importante na construção de nossa personalidade e autoestima. Acredito que a maneira como a indústria tem se relacionado com o seu público, tornando-o dependente das tendências e incentivando-o a consumir incessantemente para se sentir aceito já não faz sentido.
Essa dependência cega as pessoas, fazendo-as ignorar questões relevantes e passando a agir apenas como peça de uma grande engrenagem. Na verdade, somos protagonistas fundamentais para a mudança.
Uma moda com um ritmo mais lento, que enxerga o outro e oferece um passo mais orgânico se tornou essencial, movimento hoje conhecido como slow-fashion. Foi acreditando na importância de ressaltar esse novo ritmo que iniciei minha carreira como consultora de estilo e moda consciente.
Você já parou para pensar se a forma como consome segue essa vertente? Costuma ler as etiquetas das roupas que compra, para saber sua composição? Isso porque diferentes materiais impactam nosso planeta de formas totalmente diversas. Não é preciso ser um expert, mas um pequeno interesse é fundamental. Comparemos o poliéster com o algodão orgânico. Enquanto um utiliza recursos finitos e demora mais de 400 anos para se decompor, o outro requer um processo muito mais “limpo”, e sua decomposição não leva mais do que um ano.
Você prefere fazer compras em grandes cadeias ou prioriza marcas menores? Será que a maneira como elas tratam seus funcionários é a mesma? Será que uma loja grande consegue acompanhar toda a cadeia produtiva? E as menores? Será que elas têm domínio do processo?
Fazer o papel de pesquisador e questionar é essencial. Exigir resposta das marcas e comprar daquela que assume seu papel social e ambiental cria um maior senso de responsabilidade por parte da indústria. Desperta ainda um entendimento de que, se não se encaixar naquilo que o consumidor considera importante, seu espaço estará ameaçado.
Transparência é a palavra-chave e é por ela que temos de lutar. Claro que a sensação que nos dá é a de que somos um pequeno peixe no meio de um oceano imenso, e é por isso que fazer parte de movimentos pelo consumo consciente, como o Fashion Revolution, pode ser uma opção superlegal; uma maneira de empoderar não apenas os próprios movimentos, mas também nós, consumidores. Já ouviu falar do projeto “Quem fez minha roupa?”. É um modo muito bacana e fácil de nos engajar, essencial ao buscarmos uma mudança.
Acho fundamental esclarecer um ponto: o fato de você não comprar apenas de marcas sustentáveis não o torna um alienado nesse “novo” mundo. Infelizmente, o sustentável ainda é menos democrático: seu valor mais alto pode ser pouco viável para boa parte dos consumidores.
Por outro lado, esse investimento mais alto pode fazer sentido quando pensamos no conceito do armário cápsula — um armário onde priorizamos menos roupas, mas de melhor qualidade, que manteremos por mais tempo. Nele, também focamos em peças essenciais e versáteis, o que nem de longe quer dizer básico e sem graça.
Nossos gostos e estilos são únicos, e é por isso que o essencial muda de pessoa para pessoa. Em relação a nosso próprio consumo e a como interagimos com as nossas roupas, um dos conceitos que mais reforço é a criatividade.
Foi para provar sua importância que iniciei o projeto One Piece, Three Looks (“Uma peça, três visuais”), onde escolho itens do meu guarda-roupa e compartilho diferentes formas de explorar um item específico, em diversos estilos e ocasiões.
Antes, no entanto, de iniciar essa etapa, temos de saber tudo o que possuímos, eliminando as peças que já não fazem sentido e dando nova vida às que permaneceram.
A ideia não é ficar com um magro armário de cinco peças, mas sim valorizar aquilo que você tem.
Conhecer bem seu armário é essencial para incentivar a moda sustentável. Um guarda-roupa enxuto, usado com criatividade, traz saciedade e nos faz entender que aquilo de que precisamos não muda a cada estação.
Como resultado, nosso relacionamento com a moda passa a ser mais saudável e, consequentemente, o de todos os envolvidos com esse mercado.
Você já parou para pensar que uma indústria mais saudável, que se preocupa não só com o produto final exibido na loja, mas com toda a cadeia produtiva e com o impacto no meio ambiente e na vida de seus trabalhadores está, por mais distante que possa parecer, totalmente conectada com a sua qualidade de vida? Pois é. Esse é o verdadeiro significado de sustentabilidade.
Coluna publicada na edição de dezembro de 2018.
*Adriana Zemel, formada em marketing pela ESPM-SP e em negócios da moda pela Columbia College Chicago, consultora e criadora do projeto Moda Modifica (@moda.modifica)